sábado, 22 de março de 2025

A Penetração das Facções Criminosas nas Entranhas do Poder Público: Uma Análise das Afirmações do Presidente do TRE/CE



Por Francisco Leopoldo Martins Filho

A declaração do Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE/CE), Raimundo Nonato Silva Santos, de que "o Estado legal foi engolido pelo Estado marginal", expõe uma realidade alarmante que vem se consolidando no Brasil: a infiltração de facções criminosas nas estruturas do poder público. Essa afirmação não apenas reflete a gravidade da situação, mas também evidencia a urgência de uma resposta eficaz e coordenada para combater o avanço do crime organizado, que avança a passos largos, enquanto o Estado parece incapaz de reagir de forma proporcional.

O Estado Marginal e a Crise de Legitimidade

A expressão "Estado marginal" utilizada pelo Des. Nonato Silva sintetiza a ascensão de um poder paralelo, que opera à margem da lei, mas que, paradoxalmente, se entrancou nas instituições públicas. Essa infiltração ocorre por meio de corrupção, cooptação de agentes públicos e, em alguns casos, até mesmo pela eleição de representantes ligados direta ou indiretamente a organizações criminosas. O resultado é uma erosão da legitimidade do Estado, que perde o monopólio da força e da autoridade, cedendo espaço a grupos que atuam conforme suas próprias regras.

O avanço das facções criminosas não se limita ao tráfico de drogas. Elas diversificaram suas atividades, envolvendo-se em crimes como lavagem de dinheiro, contrabando, milícia e até mesmo gestão de serviços públicos em áreas onde o Estado está ausente. Essa expansão tem sido facilitada pela fragilidade das instituições, pela falta de um plano estratégico nacional para o combate ao crime organizado e pela ausência de políticas públicas eficazes para enfrentar as raízes socioeconômicas da criminalidade.

A Falência das Respostas do Poder Público

O descompasso entre o avanço das facções e a resposta do poder público é evidente. Enquanto o crime organizado se moderniza, utilizando tecnologia,

inteligência e estratégias sofisticadas para expandir suas operações, o Estado parece estagnado em modelos de segurança pública ultrapassados e fragmentados. A falta de coordenação entre as esferas federal, estadual e municipal, aliada à escassez de recursos e à descontinuidade das políticas de segurança, cria um cenário propício para a consolidação do poder paralelo.

Além disso, a corrupção endêmica nas instituições públicas facilita a infiltração das facções. Servidores públicos, policiais, políticos e até mesmo membros do Judiciário têm sido aliciados ou coagidos a colaborar com o crime organizado. Essa corrupção sistêmica mina a confiança da população nas instituições e reforça a percepção de que o Estado é incapaz de garantir a segurança e a ordem.

A Ausência de um Plano Estratégico

Um dos pontos mais críticos é a ausência de um plano estratégico para o combate à criminalidade organizada. Enquanto países como Colômbia e México têm implementado políticas integradas, que combinam repressão qualificada com ações sociais e econômicas para reduzir a vulnerabilidade das populações mais pobres, o Brasil ainda carece de uma visão abrangente e de longo prazo.

A falta de um plano nacional permite que as facções criminosas se fortaleçam, explorando as brechas deixadas pela ineficiência do Estado. A ausência de inteligência policial integrada, de um sistema prisional eficiente e de políticas de reinserção social para ex-detentos são apenas alguns exemplos de como o poder público falha em enfrentar o problema de forma estrutural.

Conclusão: A Urgência de uma Resposta Eficaz

A afirmação do Presidente do TRE/CE serve como um alerta para a gravidade da situação. O avanço das facções criminosas e sua infiltração no poder público representam uma ameaça à democracia e ao Estado de Direito. Para reverter esse cenário, é essencial que o poder público adote uma abordagem integrada, que combine repressão qualificada, combate à corrupção, fortalecimento das instituições e políticas sociais voltadas para a inclusão e a redução das desigualdades.

A situação é periclitante, mas ainda há tempo para agir. O primeiro passo é reconhecer a dimensão do problema e mobilizar a sociedade e as instituições em torno de um projeto comum de restauração da autoridade do Estado legal. Caso contrário, o Estado marginal continuará a avançar, colocando em risco não apenas a segurança pública, mas a própria soberania nacional.

Francisco Leopoldo Martins Filho é Advogado e Membro Efetivo da Comissão Direito Eleitoral da OOAB/CE

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