domingo, 26 de março de 2023

Promotor marcado para morrer pelo PCC conta bastidores do plano contra Moro

Foto: Marcio Oliveira/AE


Em entrevista exclusiva ao jornalista Cláudio Ribeiro, do O Povo, o promotor de justiça de São Paulo, Lincoln Gakiya, revelou com detalhes a ameaça de morte que vem sofrendo há anos pelo comando do PCC. Criticou a "politização" do caso e conclui que o PCC é hoje uma máfia com atuação no Brasil e envio de toneladas de cocaína para a Europa.

Confira a entevista:  

Itália, década de 1990: "Quem tem medo morre todos os dias. Quem não tem morre só uma vez". Frase dita pelo juiz italiano Paolo Borsellino, morto num atentado em Palermo, em julho de 1992. Era um dos magistrados mais rigorosos contra a Cosa Nostra, uma das máfias mais influentes da Europa. Homens da organização instalaram uma bomba na viatura que o juiz usava para se deslocar. Dois meses antes, Giovane Falcone, também juiz, havia sido assassinado em atentado semelhante. O país, naquele momento, sentiu os estilhaços das execuções.

Brasil, 22 de março de 2023: a Polícia Federal deflagra a Operação Sequaz em quatro Estados (Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo e Rondônia) e no Distrito Federal. O ex-juiz, ex-ministro, hoje senador Sergio Moro (União Brasil-PR), sua família, gestores penitenciários, servidores públicos, autoridades, todos eram alvos de possíveis atentados ou sequestros da maior organização criminosa da América Latina. Nove pessoas haviam sido presas até a publicação desta entrevista.

A gênese da investigação foi uma pista recebida pelo promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Ministério Público de São Paulo. A dica foi de uma testemunha, ex-integrante do PCC, que vive sob proteção: a facção agora iria matar ou sequestrar gente importante. E o nome de Moro saltou entre as informações repassadas. O de Gakiya também estava na lista da facção. Já se sabia, desde o ano passado, que o plano para resgatar Marcola (Marcos William Herbas Camacho), o nº 1 do PCC, preso desde 1999, ainda era prioridade.

Os alvos do novo plano seriam quem estava atrapalhando o resgate do chefe criminoso. Moro havia determinado ordens contra Marcola dos tempos de ministro da Justiça. Nas mensagens interceptadas em celulares, as operações eram chamadas em códigos de "STF" (o resgate) e "STJ" (os atentados e sequestros). Os alvos estavam sob vigilância intensa. O nome da operação Sequaz se refere ao ato de seguir, vigiar, acompanhar alguém. "Filmar", no jargão do crime.

Tudo esteve muito perto de acontecer. "Decretado" pela facção desde 2019, Gakyia também era um dos alvos da vez, o que nem surpreendeu — "eles cobram porque estou vivo ainda". O promotor acredita que Moro não seria morto, talvez vítima de sequestro — dele ou de algum familiar. "Ninguém vai alugar uma chácara para matar um senador. A gente imagina isso, não está escrito". A condução do inquérito é da Polícia Federal (PF). A tensão social no País poderia servir de barganha para os criminosos serem devolvidos das prisões federais para seus Estados de origem.

Gakiya tem 56 anos de idade e mais de duas décadas atuando em condenações para gente do primeiro e segundo escalões da facção. O promotor dimensiona o PCC já como "máfia", com mais de R$ 5 bilhões por ano passando no caixa da organização. Nesta entrevista, feita no dia seguinte à operação da PF, ele também criticou o "uso político" que foi feito da Operação Sequaz, a partir declarações polêmicas tanto de Lula como de Bolsonaro, e de apoiadores dos dois lados. 

O POVO - A semana está sendo bem atribulada, dado esse caso todo e a repercussão. Mas está muito diferente da sua rotina?

Lincoln Gakiya - Ah, com certeza. Na verdade, essa operação que foi deflagrada é da Polícia Federal, mas as investigações começaram aqui no Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), do Ministério Público de São Paulo (MPSP), e eu estava à frente do trabalho.

OP - Então já emendo a pergunta: qual foi o momento exato que se soube desse plano para sequestrar e matar autoridades, incluindo o seu nome e de Sergio Moro?

Gakiya - Desde a remoção do Marcola e dos líderes da facção para o sistema penitenciário federal, a gente tem uma série de investigações no MPSP por conta dessas retaliações, de planos de resgate, até pela minha própria segurança pessoal. Eu mantenho essas investigações até porque foi decretada minha morte tão logo o Marcola fosse removido. Nesses procedimentos investigatórios detectamos que havia dois tipos de planejamento. O primeiro deles, que denominaram “Plano A”, que é a prioridade do PCC, o resgate do Marcola. Isso ficou bem evidenciado na operação que a Polícia Federal fez, denominada Anjos da Guarda, em agosto do ano passado, em que houve a tentativa de resgate do Marcola em Porto Velho (RO). Foi amplamente noticiada pela imprensa. E nessa mesma operação, no material que a própria PF divulgou, havia plano A e plano B. O plano A eles chamavam de “STF”, de maneira codificada, e o plano B era o “STJ”. O que era o STJ? Era justamente que se o plano A falhasse, se o resgate não fosse possível, a determinação era praticar atentados e sequestros contra agentes públicos, não só federais como estaduais.

Nessa perspectiva, por esse motivo tínhamos a investigação em andamento. Não tínhamos nada a respeito do ex-ministro Moro. No final de janeiro deste ano, surgiu uma informação, através de uma testemunha protegida — minha inclusive, em um processo meu —, dizendo que além do plano para me matar, o que já não era nenhuma surpresa para mim, por exemplo, haveria plano para sequestrar e matar outras autoridades e agentes públicos. E que uma dessas autoridades, que essa testemunha ouviu, seria o ex-ministro Moro.

A gente ficou extremamente preocupado, sabíamos que havia realmente esse plano B. De fato, o Marcola acabou sendo removido para Brasília (DF). Coincidiu de essa remoção ser em janeiro. Ou seja, os planos dele para ser resgatado vieram por água abaixo. Porque o presídio federal de Brasília está extremamente seguro. Eu mesmo estive lá no dia 31 de janeiro. A nova muralha tem mais de um metro de concreto, suporta até um choque de um avião, de um veículo militar blindado, as guaritas todas blindadas. Coincidiram então duas coisas. Nessa investigação que a gente já fazia para saber se haveria algum atentado, uma testemunha me procura para narrar, ela tomou conhecimento que uma dessas supostas vítimas seria o ministro Moro.

Então levamos o caso, no final de janeiro deste ano, à cúpula da Polícia Federal em Brasília. Fomos eu e o procurador-geral (de São Paulo, César Mattar Jr). E também tivemos que comunicar à cúpula do Senado e da Câmara. Porque Moro havia sido eleito senador, não havia tomado posse ainda, e a esposa dele foi eleita deputada federal (Rosângela Moro, do União Brasil-PR). A Polícia Federal instaurou o inquérito em Curitiba (PR), porque a residência de Moro e de sua família é em Curitiba. Isso no dia 2 de fevereiro, tudo com participação do MP de São Paulo. Ou seja, as provas que tínhamos, compartilhamos com a Polícia Federal. Foi uma operação integrada do Gaeco com a Polícia Federal.

OP - Desde quando havia o plano para o Marcola ser resgatado?

Gakiya - O plano para resgatar Marcola vem desde a época que ele estava aqui em Presidente Venceslau (SP). Por isso que ele foi removido para o sistema penitenciário federal. Esse plano nunca deixou de existir. Ele saiu daqui com a determinação (dada para a facção) “é para eu ser resgatado onde eu estiver”.

OP - Em 2020 já havia a notícia sobre esse plano.

Gakiya - Em 2019, se você verificar aí, foi decretada uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem), logo que ele chegou na penitenciária de Brasília, justamente porque detectaram drones, que faziam parte do plano para resgatá-lo. Depois, (em março de 2022) ele foi mandado para Porto Velho (RO). Aí o plano de resgate mudou para Porto Velho. Lá, a Polícia Federal descobriu, junto com o Depen (Departamento Penitenciário Nacional, que administra as penitenciárias federais), em agosto de 2022 — quando deflagraram a operação Anjos da Guarda —, a continuidade desse plano de resgate para Porto Velho. E eles (presos) trataram disso, “olha, veja como está meu processo no STF”, “se não der certo, vê como está meu processo no STJ”. Isso você pode confirmar com dados da Operação Anjos da Guarda.

OP - Tem algum lance a mais dessa operação da PF, sobre o plano de atentados e assassinatos, já iniciado na investigação pelo MP de São Paulo, que seja ainda mais específico?

Gakiya - Não. Quem tem que contar essa história é a Polícia Federal, porque a investigação está com eles. O que estou dizendo é que esse plano, que não é só contra o Moro — também é contra o Moro —, ele é um desdobramento de um plano de resgate do Marcola. O Marcola tem esse plano descoberto, volta no final de janeiro para a penitenciária federal de Brasília, aí vemos que existe o plano B, que é essa situação. Inclusive informação dada pela testemunha protegida. Por isso que levei o caso para a Polícia Federal, eles instauraram o inquérito, e isso foi comprovado pela PF. Não ficou só no que a testemunha falou. Eles fizeram uma série de quebras de sigilo telefônico, telemático, trabalho de campo, e chegaram até isso, juntamente conosco. Tenho acompanhado essa investigação desde o dia da instauração, tenho contato quase diário com a equipe, com o delegado que está à frente da investigação. Até porque nós temos a nossa aqui em andamento também. Um pode ajudar o outro.

OP - Quando foi que Moro e a esposa, e os outros alvos da facção, foram alertados sobre esse plano, para que recebessem proteção? E quando o senhor teve um encontro presencial com o senador sobre isso?

Gakiya - Tive. Imediatamente quando nós descobrimos essa informação, que foi o recado que recebi da testemunha protegida, e ainda precisava ouvi-la, mas já tinha outros elementos que poderiam apontar para o Moro, ele foi avisado já no final de janeiro. Mas, pessoalmente, eu estive com ele e o procurador-geral no dia 30 de janeiro. Nós conversamos com o ex-ministro e a mulher dele, a Rosângela, e informamos que foi descoberto um plano e que poderia se tratar de um atentado ou de um sequestro. Até porque isso não está esclarecido. Pela experiência que nós temos, achamos que é um atentado porque esse plano envolvia família. E, normalmente, até onde eu sei e atuei, o PCC não costuma atacar famílias, filhos, mulheres.

OP - É um caso fora da média do que o PCC costuma praticar?

Gakiya - Eu acredito que esse plano é realmente diferente, não é só para matar alguém, para retaliar. Na verdade, talvez eles quisessem negociar. Não só com o sequestro do Moro, dos familiares, ou de outras autoridades, ou mesmo atentando contra a vida dessas outras autoridades. Quer dizer, causar uma desordem pública no país. Estou falando de vários estados com vários alvos.

Mas, até então, a gente não tinha nenhuma notícia de quem seriam os outros alvos. E já adianto isso pra você. Só no dia 30 de janeiro o Moro foi avisado, junto com sua esposa, que seria pedida a abertura de inquérito na Polícia Federal. Inclusive, fizemos isso na mesma data. Primeiro falamos com o Moro e a esposa em Brasília, eu e o procurador-geral. Dali já fomos nos reunir com a diretoria da Polícia Federal, levar em mãos uma representação do MP de São Paulo, fui eu que assinei, requisitando a instauração de inquérito policial com esse fato envolvendo o ex-ministro e seus familiares.

A partir daquela data, ele já passou a receber escolta policial, porque avisamos também à Polícia Legislativa, tanto do Senado como da Câmara. Que por sua vez avisou ao presidente da Câmara (Arthur Lira, PP-AL), ao presidente do Senado (Rodrigo Pacheco, PSD-MG), para as providências de segurança dessas autoridades.

OP - E os demais alvos?

Gakiya - Os demais alvos não eram conhecidos por mim, por exemplo. Eu era, evidentemente, porque além de eu saber isso, a própria testemunha narrou. Mas os demais alvos eu não sabia e não sei exatamente quem são.

OP - E quantos são?

Gakiya - Não sei quantos são, não sei. Está saindo um monte de especulação, quem pode dar essa informação é só a Polícia Federal. O processo está sob sigilo (derrubado pela juíza Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, ainda na quinta-feira, 23) e aí é com eles. Mas eu sei que tem alvos em Porto Velho, em Campo Grande e em Curitiba.

Não é algo contra o Moro especificamente, mas contra vários alvos ligados ao setor de segurança pública. O que a PF está apurando, e apuramos aqui também, que pela situação que envolvia aluguel de chácara, possível cativeiro, mais de uma chácara, não aparentava que fosse um atentado contra a vida do senador, e sim um sequestro. Até porque tinha dados de familiares dele também (em cadernos apreendidos com anotações sobre a rotina de vários dos alvos).

Ninguém vai alugar uma chácara para matar um senador, não tem sentido. Possivelmente seria cativeiro. E talvez não só com relação a ele, mas com outros alvos, que, aí sim, achamos que poderia ser um atentado mesmo. Provocar uma desordem pública em vários estados e forçar, talvez, a devolução do Marcola e de lideranças da facção para seus estados de origem. A gente imagina que é isso, não está escrito. Mas é a única coisa que faz sentido.

OP - Foi estimado quantas pessoas da facção iriam participar do plano e qual valor estavam gastando?

Gakiya - O que foi identificado, de maneira muito eficaz pela Polícia Federal, são as pessoas cujos mandados de prisão e de busca foram expedidos. Mais de uma dezena de pessoas, todas identificadas, a maioria com ordens de prisão expedidas, e outras com mandado de busca, para depois verificar se vai ser necessária ou não a prisão.

OP - E as ordens desse plano também foram dadas de dentro dos presídios?

Gakiya - Não é que houve ordem dada de dentro do presídio. Numa situação dessa não posso dizer, porque o Marcola está dentro de penitenciária federal, tem que conversar com o Depen. Mas nenhum integrante do PCC vai sequestrar ou matar o ex-ministro Moro ao arrepio de qualquer ordem que seja dada pela cúpula (da facção). Porque isso vai resvalar na cúpula também. Ninguém tem autonomia para fazer uma coisa dessas.

OP - Mas a cúpula está toda em presídios.

Gakiya - A cúpula está toda removida para o sistema penitenciário federal. Fiz a remoção em fevereiro de 2019. Foram 22 líderes do primeiro e segundo escalões.

OP - O PCC tem mais de 40 mil membros. Na comparação, é muito maior que as três principais máfias italianas (Ndrangheta, Camorra e Cosa Nostra), que têm juntas de 25 mil a 30 mil integrantes. O juiz aposentado Walter Maierovitch (comentarista da rádio OPOVO CBN) fala que o PCC ainda é pré-máfia, mas o senhor já considera como máfia.

Gakiya - Eu acho que já é máfia. Porque o que separava o PCC do estágio mafioso, e não estou falando das máfias italianas, mas falo em termos doutrinários. Existe uma classificação de organização criminosa do tipo mafiosa. O PCC tem todos os requisitos. Ele só não tinha o da lavagem de dinheiro estruturada, mas ele tem hoje. Por isso que passei a classificar o PCC como máfia. Mas cada um dos pesquisadores, investigadores, pode achar diferente. Se o Maierovitch entende diferente, ele tem as razões dele. Eu era um dos que defendiam que o PCC era uma organização pré-mafiosa. E eu dizia que não tinha a lavagem de dinheiro estruturada. Mas isso antes de 2019. Agora a gente já tem comprovação de que há lavagem de dinheiro estruturada, inclusive dinheiro mandado para fora do Brasil.

OP - Qual é a movimentação financeira do PCC hoje, para atualizarmos esse dado, já que o o senhor já atualizou o perfil de pré-máfia para máfia?

Gakiya - As classificações que eu dou são sempre com base em investigações. A gente teve a Operação Sharks, (tubarões, na tradução do inglês, que mirava o caixa da facção), deflagrada em 2020 (setembro). De 2019 para 2020, o PCC mandou para fora do País R$ 1,2 bilhão. Só que isso era o faturamento interno do PCC, o tráfico feito dentro do estado de São Paulo. E o grosso hoje da arrecadação do PCC, que equivale talvez a três, quatro ou cinco vezes mais desse valor, é o tráfico internacional de cocaína para a Europa.

O PCC hoje se dedica basicamente ao tráfico internacional. Então, R$ 1,2 bilhão é referente só ao tráfico interno. Então a gente calculava em 500 milhões de dólares, ou seja, três a cinco vezes mais do que a arrecadação interna, referente ao faturamento anual do PCC. Já que eles vendem lá a cocaína a R$ 35 mil, o quilo. Eles colocam na Europa de três a quatro toneladas de cocaína por mês. Então a gente faz um cálculo de arrecadação a partir de R$ 5 bilhões.

OP - O senhor diz que não se surpreende mais de quererem matá-lo, porque são vários planos já anunciados, que sempre é citado em possíveis atentados. O que lhe incomoda mais nessa situação?

Gakiya - Vou deixar uma coisa bem clara: não é que eu não me surpreendo mais com planos para me matar. A ordem já foi dada, eu fui decretado. Pelo Marcola e pela cúpula. E isso não vai ser retirado, ponto. Agora, como isso vai ser executado? Depende de vários fatores. Da minha segurança, de quem vai executar, e esses planos vão migrando de lugar para lugar, de presídio para presídio, de criminosos na rua. Não é que são vários planos ou várias ameaças.

Na verdade, a ordem foi dada e inclusive eles cobram porque eu estou vivo ainda. Já faz quatro anos que a ordem foi dada e eu não fui morto. Evidentemente que não fui morto por conta de um serviço de inteligência que temos no estado de São Paulo, que é muito bom. Você pode ver que todos esses planos nós conseguimos nos antecipar. Não são cartas enviadas para mim. Eu nunca recebi uma carta me ameaçando. Nunca fui ameaçado, para dizer a verdade.

O que a gente consegue é, por exemplo, numa revista de cela, depois que o preso jogou no vaso sanitário ou pela janela, o detalhamento de um plano para me matar. Ou então com algum criminoso na rua, algo pego no celular com dados meus, ou drones sobrevoando minha casa. Ou o trajeto da minha escolta, algo aqui no Ministério Público. São situações que eles estão tentando, mas agora está difícil. Porque eu tenho uma escolta hoje que, acredito, nenhuma autoridade no País tem.

OP - O senhor pode dizer quantas pessoas?

Gakiya - Não posso, evidentemente (risos). De maneira nenhuma.

OP - O senhor considera que esse plano atentando contra alguém foi o mais ousado que o PCC já fez no Brasil?

Gakiya - Não, não. O plano mais ousado que o PCC já fez no Brasil foi matar o juiz José Machado Dias (juiz-corregedor de Presidente Prudente, morto a tiros em 14 de março de 2003). Foi o pior que já fizeram, tem repercussão até hoje. Inclusive era meu amigo pessoal. Mas, realmente, a ideia de sequestrar o Moro, que é uma figura pública,ou atentar contra ele ou contra mim, isso evidentemente vai causar um clamor público, vai mexer como está mexendo. Só a descoberta do plano já tá dando essa mídia toda.

OP - O presidente Lula falou que esse caso seria uma "armação do (senador) Moro".

Gakiya - (Interrompe o restante da pergunta) Ah, isso eu não vou responder, desculpa. Inclusive, eu lamento muito que as autoridades, todas elas, envolvidas ou não na investigação, estão fazendo uso político de uma investigação que é extremamente séria. Porque ela não foi feita só pela Polícia Federal. Eu conheço os delegados e os policiais que estão atuando. Porque essa investigação se iniciou com o Ministério Público, eu participo da investigação.

Na medida em que alguém fala que é falso, ou que alguém usa politicamente também, do outro lado — e para mim não importa o lado, até porque esse plano já existe desde o ano passado —, então, não vou fazer nenhum tipo de comentário político. Hoje já cortei uma entrevista no meio. Só tô explicando o porquê, e você já deixou bem claro. Eu acho muito difícil você inventar uma situação com inquérito, com juiz, com Ministério Público Federal e Estadual envolvidos.

OP - A pergunta é cabível pela declaração e pelo personagem que deu essa declaração, que foi o presidente da República?

Gakyia - Para você ter uma ideia, estou sem almoço e sem café da manhã, hoje também. E acabei de ver aqui que me mandaram pelo WhatsApp. Não havia visto, achei até estranho o presidente atacar a própria Polícia. Se ele disse que (Moro) inventou, está atacando a própria Polícia. Eu vou elogiar a Polícia Federal, que fez um trabalho excepcional. E não é comum a gente atuar em parceria, como fizemos nesse caso. Acho que isso é a chave para você poder atuar contra facções criminosas. Como no caso do Rio Grande do Norte, já em São Paulo em 2006, a gente tem feito isso de atuar de maneira integrada.

A PF atuou com o Ministério Público, com as polícias de São Paulo, de maneira integrada e coordenada desde o início da investigação até hoje. Independente do fato de uma das vítimas, não é só uma vítima, ser o Sergio Moro, que é hoje opositor do Governo Federal. A Polícia Federal e o Ministério Público são órgãos de Estado. A gente não está a trabalho do governante de plantão. Se não houver crime, não há crime. Se houver, nós vamos investigar. Essa é a questão.

(Cláudio Ribeiro/O Povo)

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