Jornalista Demontier Tenório. |
"Agradeço-lhe, mais uma vez, a sua generosidade frequente, com o envio das matérias publicadas no Miséria, como a de ontem, com a qual você relembrou aquele fatídico 6 de janeiro de 1950, o do assassinato de Mons. Joviniano da Costa Barreto.
Gostaria de dizer-lhe, Demontier, que tenho muito gosto em ler estes seus textos, especialmente porque você é dos poucos jornalistas desta mais nova safra que tem um cuidado especial para com as lições do passado, indo sempre, como dizia um dos seus leitores, ao baú da história para dali retirar elementos importantes para suas matérias.
É o caso deste capítulo horroroso que Juazeiro viveu naquela primeira sexta feira do ano, quando o fato aconteceu, pelos anos por mim inteirado com os comentários em família, e que me deixavam muito curioso para compreender a trama e suas circunstâncias.
Há uns bons anos, Demontier, eu venho procurando, à luz de uma revisão de textos da imprensa e do panfletário, revisitar o contexto da época, para tentar compreender o pretexto do brutal assassinato, analisando as entrelinhas que guardaram opiniões e juízos que até perpetraram o tresloucado gesto do doente mental Manoel Pedro da Silva.
Monsenhor Joviniano assistiu o nascimento de minha família, casando meus pais em 08.12.1948, na Igreja-Matriz de Nossa Senhora das Dores, onde ele também me batizou na manhã do dia 22.10.1949, 75 dias antes de morrer.
Na minha adolescência, Demontier, a tradição oral era de exaltação ao mártir, vítima de um negro maluco que teve a sua pretensão contrariada, pois queria que Monsenhor fizesse o seu casamento com uma mulher casada.
Frequentei escolas e agremiações que não faziam, senão, a elegia de seus grandes méritos de sacerdote cristão, à margem das grandes intrigas, decorrentes da sua determinação de combater o Pe. Cícero e o propalado fanatismo religioso da cidade.
Tenho uma coleção de boletins apócrifos que pontuavam os conflitos de grupos com Mons. Joviniano, marcados por sua inequívoca perseguição, desde que assumiu a Paróquia de Juazeiro, com o objetivo de destruir o amor que os romeiros manifestavam ao Padre Cícero.
Esses boletins, Demontier, são extremamente virulentos e a sua linguagem panfletária não escondia uma trama que elegeu Pe. Cícero, romeiros, Salesianos e Diocese, e que terminaria por armar o débil mental Manoel Pedro com uma peixeira para assassinar Monsenhor.
Veja só este pequeno trecho, meu amigo: “O Padre Cícero deixou no seu lugar os Padres Salesianos. Os Padres Salesianos que tem vindo para cá, quando se tornaram queridos dos romeiros, por causa da sua humildade e grandes virtudes, e começaram a chamar a atenção dos romeiros para o Colégio. O Monsenhor Joviniano começa logo a fazer campanha para botá-los para fora do Juazeiro. Frei Damião está proibido pelo Monsenhor Joviniano, a nunca mais pisar aqui. Mas, sabem vocês, romeiros, porque é isso? É por causa do dinheiro!!! Os romeiros estavam se passando para os Salesianos, deixando a Matriz. As esmolas da caixa de Nossa Senhora das Dores que o Monsenhor todos os anos despesca, atingem a mais de quinhentos contos de reis e de agora em diante este dinheiro ia para a construção do Templo de Nossa Senhora Auxiliadora. Esse dinheiro atualmente está sendo desviado para o Bispado do Crato, para a construção de casas da Obra das Vocações Sacerdotais, naquela cidade. Isto reverte em prejuízo para o Juazeiro.” E vai por aí, meu amigo.
Confesso a você, Demontier, que da revisão destes momentos, ainda fica para mim a sensação de que o cadáver de Mons. Joviniano, se revira no túmulo, a cada nova romaria que nos chega, exatamente ele que achava que isto não duraria 10 anos.
E, desgraçadamente, 10 anos nem ele mesmo durou..."
(Crônica lida durante o Jornal da Tarde, da FM Padre Cícero, Juazeiro do Norte, em 07.01.2015)